No debate presidencial entre Kamala Harris e Donald Trump, talvez o único, infelizmente, os microfones foram desligados quando os rivais perderam o controle dotempo. Isso ajudou artificialmente a civilidade e evitou algumas das trocas mais tensas e de baixo nível de debates recentes. Também mascararou uma das coisas mais importantes: o caráter dos candidatos e como eles agem quando ninguém está ouvindo.
No final dos anos 1990, quando me mudei dos Estados Unidos para o Brasil, fiquei impressionado com os argumentos combativos entre os congressistas. A esmagadora maioria dessas guerras de palavras era entre homens — e todas as lutas físicas que vi na TV Senado também eram. Aprendi rapidamente que a reverência excessiva e falsa poderia ser misturada com o insulto direto em apenas uma frase curta: “Vossa excelência é uma canalha desgraçada”. Às vezes, trocas verbais acaloradas se transformavam em altercações físicas.
Em contraste, os políticos na Câmara e no Senado dos EUA, na época, pareciam seguir o que eu via como decoro padrão dentro e fora da TV. A C-SPAN, o equivalente americano da TV Senado, era um canal felizmente chato. Vozes elevadas eram raras. Brigas estavam fora de questão. Claro, esses políticos não eram mais anjos do que seus colegas brasileiros. Nós, humanos, somos lindamente e brutalmente falhos em todos os lugares. A diferença era que o público e o sistema esperavam que os congressistas dessem o exemplo.
Como os tempos mudaram! Os debates nos mais altos níveis de poder nos EUA não são mais o que costumavam ser. Isso é verdade independentemente do seu ramo favorito do governo: Executivo, Congresso ou Suprema Corte. A discussão crítica de propostas de políticas públicas deu lugar a xingamentos e ataques pessoais. Os fiéis do partido agem como torcidas organizadas que estão dispostas a derramar sangue, não a participar de um jogo limpo e organizado. Elaborar, revisar e aprovar legislação que aborde problemas generalizados não é a principal prioridade. Vencer é. Até mesmo a Suprema Corte, que foi a última a perder sua reputação de excelência, caiu no partidarismo.
Ao assistir o debate lamentei que os microfones estavam mudos. Observei a linguagem corporal e as expressões faciais dos candidatos quando eles não estavam falando. Torci para que ambos os candidatos se lembrassem com quem estavam falando e para quem estariam trabalhando, no caso da vitória em novembro — toda a população de um país atualmente dividido. Não tenho orgulho das vezes em que fui excessivamente duro com estranhos, colegas de trabalho e queridos em busca de ganhar argumentos. Espero que nossos candidatos também não. A esperança, no entanto, não é uma estratégia. Sei em quem vou votar. E vou votar.
(*) Jason Dyett é vice-presidente e cofundador do UNINTER Global Hub. Baseado em Boston, possui 25 anos de experiência na fundação e crescimento de iniciativas do setor privado e de ensino superior nos EUA e no Brasil. Possui MBA pela Booth School of Business da Universidade de Chicago e bacharelado com distinção pela Universidade de Vermont.
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JULIA CRISTINA ALVES ESTEVAM
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